Najla Said e Edward Said |
Najla Said, filha do intelectual palestino e líder pós-modernista Edward Said, falecido, tentou ignorar a cultura e herança palestina que lhe foi passada por seus pais em sua casa de Manhattan, quando era jovem. Mas os ataques de 11 de Setembro e a subsequente atitude azeda com árabes-americanos a fez repensar.
Por Taly Krupkin*
Título original:
"Como ser filha de um intelectual palestino em Nova York pós-11/9"
Depois de representar um “show de uma só mulher” chamado “Palestina em Nova York, em 2003”, Najla decidiu descrever a sua infância em sua memória inaugural, “Procurando pela Palestina: Crescendo Confusa em uma Família Árabe-Americana”.
“Sou uma mulher palestina-libanesa-americana cristã, mas comecei minha vida como uma WASP”, escreve Najla em seu novo livro. “Fui batizada em uma Igreja Episcopal e enviada a uma escola feminina privada na seção leste de Manhattan, uma que se gaba entre seus alunos tão bem penteados de sangue azul e americanos, como a legendária Jacqueline Onassis. Foi naquele ponto em que me dei conta de que algo estava gravemente errado comigo”.
A filha de Said escreve sobre as diferenças entre ela e os outros alunos: “Eu estava profundamente orgulhosa do meu casaco verde novo com o seu emblema chique da escola e meus sapatos elegantes da França. Mas mesmo o mais elaborado uniforme poderia proteger contra minha consciência instantânea das minhas diferenças. Eu era um rato de cabelos pretos em um mar de perfeição loira. Não tinha uma cama de dossel, um quarto despojado, ou uma sala de estar perfeitamente decorada, como tinham meus colegas”.
“Eu tinha livros empilhados sobre prateleiras e mesas, cachimbos, canetas, tapetes orientais, paredes pintadas e visitas estranhas. Era cercada, em casa, não só por alguns dos maiores acadêmicos e escritores do mundo (Noam Chomsky, Lillian Hellman, Norman Mailer, Jacques Derrida, Susan Sontag, Joan Didion), mas também pelo creme do creme da resistência palestina”.
Edward Said nasceu em Jerusalém, de uma família árabe cristã, em 1935, e foi criado em Jerusalém e no Cairo, onde seu pai geriu vários empreendimentos. Em 1951, Said estudou nos Estados Unidos, e depois se tornou professor de literatura na Universidade Columbia, em Nova York. Após a Guerra dos Seis Dias [em 1967], Said começou a interessar-se pela questão palestina, e se tornou próximo dos líderes da Organização para a Libertação da Palestina.
Seu livro “Orientalismo” alcançou um grande público, e colocou-o no centro da controvérsia entre círculos intelectuais pelo mundo. Orientalismo, publicado em 1978, é uma crítica brilhante e eloquente do Ocidente, da academia, dos acadêmicos e artistas que investigaram sobre o modo de vida do Leste, não necessariamente pelo interesse do conhecimento, mas para perpetuar a conquista ocidental e a dominação sobre o Leste. Assim, de acordo com Najla Said, o mundo árabe foi visto como estagnado, submisso e atrasado, por oposição ao supostamente superior mundo ocidental.
Najla escreve que, quando pressionou seu pai para explicar o conceito de orientalismo em palavras simples, ele disse: “Historicamente, através da literatura e da arte, o ‘Leste’, como visto através das lentes ocidentais, se torna distorcido e degradado, para que qualquer coisa ‘diversa’ do que nós ocidentais reconhecemos como familiar não seja apenas exótica, misteriosa e sensual, mas também inerentemente inferior”. E ela completa: “Você sabe, como o Aladdin”.
Edward Said e Mariam |
No livro, Najla relembra que, como muitos filhos de imigrantes, ela cresceu confusa pelos valores conflitantes aos quais foi exposta. “Crescer como a filha de uma mãe libanesa e um proeminente pensador palestino na cidade de Nova York, na década de 1980 e 1990, foi confuso e perturbador”.
“Eu lutei desesperadamente para conciliar a cultura e o mundo amoroso, belo e confortável do meu lar, da minha cultura e da minha família com o lugar e a sociedade supostamente ‘bárbara’ e ‘retrógrada’, como os outros os percebiam”. Em uma entrevista para a Rádio Pública Boise State, Najla disse que, depois dos ataques de 11 de Setembro, ela sentiu-se aterrorizada e temia a sua morte, mas ao mesmo tempo, ela temia que os norte-americanos passassem subitamente a chama-la de árabe-americana.
Najla também aborda o legado e a autobiografia do seu pai. A luta de Edward Said pela independência palestina o tornou uma figura controversa em Israel e no mundo judeu-americano. Em 2000, uma foto de Said lançando uma pedra em direção a Israel, desde a fronteira do Líbano, deu a ele ampla publicidade.
Para algumas pessoas, escreve Najla, “ele é o símbolo da autodeterminação palestina; um campeão dos direitos humanos, igualdade e justiça social. Ainda assim, outros insistem que ele era um terrorista, apesar de as pessoas que o conheceram saberem que isso é quase como chamar Gandhi de terrorista”.
*Taly Krupkin é um professor israelense que leciona em diversas universidades, em Israel e no exterior.
Fonte: Ha'aretz, Vermelho Tradução: Moara Crivelente, da redação do Vermelho
Imagem: Vermelho, Google (colocadas por este blog)
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