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sábado, 4 de maio de 2013

‘Brasil precisa saber a verdade sobre a morte de Jango’



Por Tadeu Breda, da Rede Brasil Atual

“O Brasil e o Cone Sul precisam saber.” É assim que a advogada Rosa Cardoso justificou ontem (3) a recente decisão da Comissão Nacional da Verdade (CNV) em pedir a exumação dos restos mortais do ex-presidente João Goulart. “Se sua morte foi realmente provocada pela ingestão de substâncias tóxicas, será mais uma prova que se juntará a muitas outras evidências que apontam para a possibilidade de Jango ter sido assassinado.”

João Goulart governou o país no curto lapso entre a renúncia de Jânio Quadros, em 1961, e o golpe militar que instaurou uma ditadura no país, em 1º de abril de 1964. Após ter sido derrubado, o presidente exilou-se no Uruguai. Sua morte aconteceria mais de doze anos depois, em 6 de dezembro de 1976, numa fazenda argentina – oficialmente, devido a um ataque cardíaco. Na época, Jango, que havia recuperado seus direitos políticos, ensaiava regressar ao Brasil.

De acordo com testemunho de Mário Neira Barreiro, agente do serviço secreto da ditadura uruguaia preso no Rio Grande do Sul por crimes comuns, a falência cardíaca que acometeu o ex-presidente teria sido provocada por uma espécie de envenenamento. Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, em 2008, o ex-espião disse que Jango, a pedido do governo brasileiro, fora monitorado 24 horas por dia pelos regimes argentino e uruguaio durante todo seu exílio. Barreiro afirma que ele mesmo vigiou João Goulart durante quatro anos. Essa perseguição teria viabilizado o suposto assassinato.

“A ação é mais um exemplo da Operação Condor”, analisa Rosa Cardoso, em referência à articulação internacional entre as ditaduras sul-americanas para produzir informação, perseguir, sequestrar e eliminar pessoas consideradas inimigas dos regimes de força que se alastraram pelo continente na segunda metade do século 20. “Por isso, queremos fazer a exumação com peritos da Argentina, Brasil, Uruguai, Chile e até dos Estados Unidos, porque são países que estiveram articulados na Condor. Isso dará mais credibilidade aos trabalhos.”


Indícios

 Rosa Cardoso, da Comissão Nacional da Verdade
A advogada, que atualmente exerce as funções de coordenadora-suplente da CNV, afirma que existem fortes indícios de que Jango sofreu “não exatamente um envenenamento, mas os efeitos de uma substância colocada em pílulas que tomava para o problema cardíaco que tinha”. O agente uruguaio afirma que o ex-presidente foi morto devido a uma troca proposital de medicamentos. “O primeiro ingrediente veio da CIA e foi testado com cachorros e doentes terminais. O doutor deu os remédios e eles morreram”, conta. “Não posso dizer a fórmula química, porque não sei. Ele colocava dentro de um comprimido.”

São exatamente estas dúvidas que a exumação tentará esclarecer. De acordo com assessores da CNV, o depoimento de Mário Barreiro é considerado “quente” pelos membros da comissão e pela família de Jango. Sobretudo porque o uruguaio conhecia informações detalhadas da vida dos Goulart, inclusive sobre um acidente de carro ocorrido naqueles anos envolvendo João Vicente, um dos filhos do ex-presidente. Na época, ninguém soube do sinistro porque os familiares decidiram mantê-lo em sigilo. Mas Barreiro sabia – o que demonstraria que, de fato, João Goulart e seus parentes mais próximos estavam sendo monitorados pela repressão.

A expectativa é que as análises laboratoriais consigam detectar resquícios de substâncias químicas nos ossos de Jango. Anteriormente, os herdeiros do ex-presidente se opunham à realização de uma exumação se não houvesse certeza absoluta de que os exames chegassem a alguma conclusão: qualquer uma. Devido ao longo tempo decorrido desde o enterro, porém, não foi possível afirmar com 100% de segurança que as perícias serão eficazes. Ainda assim, em diálogo com a CNV e uma série de outros órgãos do Estado brasileiro, a família resolveu endossar a exumação. A palavra final foi dada após audiência pública da comissão em Porto Alegre no último 8 de março.

Negociações

“Fui procurada pessoalmente por João Vicente”, confirma Rosa Cardoso, ao anunciar que os procedimentos serão financiados pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, com empenho especial da ministra Maria do Rosário, que é gaúcha. “Dependendo das técnicas, ainda mais num caso antigo, você tem a possibilidade de não encontrar resultados, mesmo tendo havido uma envenenamento”, explica. “Se a exumação determinar que houve envenenamento, teremos uma prova concludente. Se não, pode-se admitir que a passagem do tempo impediu que se encontrassem provas.”

Além de contar com a participação de peritos dos países envolvidos na Operação Condor, a CNV está correndo atrás de uma “sumidade” internacional no assunto para acompanhar os trabalhos, que deverão ser viabilizados por uma decisão judicial. Segundo Rosa, o grupo escolheu a via dos tribunais para poder juntar as evidências que porventura forem encontradas a um eventual processo criminal pela morte do ex-presidente. “Vamos entrar com pedido antecipado de colheita de provas à justiça de São Borja (RS), onde Jango está sepultado.”

Ainda não há qualquer previsão para a data em que os restos mortais de Jango serão exumados. “Vai depender de uma articulação entre familiares, CNV, Ministério Público Federal, Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos e demais entidades que estão auxiliando os trabalhos”, revela Rosa. “Por enquanto, é a única exumação que temos em vista.”


Fonte: Sul21

Imagens: Google 

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