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domingo, 19 de fevereiro de 2012

Síria, a nova Líbia



Uma Kalashnikov era vendida no Iraque até recentemente por US$100. Agora, custa no mínimo $1.000, mais provavelmente $1.500 (longe vão os dias em que os sunitas que se uniam à resistência, em 2003, podiam comprar uma Kalashnikov falsa, fabricada na Romênia, por $20).


Por Pepe Escobar*

Destino preferencial das Kalashnikov de $1.500 em 2012: a Síria. Rede: a al-Qaeda na Terra dos Dois Rios, também conhecida como AQI. Compradores: jihadis infiltrados que operam ombro a ombro com o chamado Exército Sírio Livre (Free Syrian Army, FSA).

Também operam como correia de transmissão entre Síria e Iraque as explosões de carros e os suicidas-bomba, como as duas explosões recentes nos subúrbios de Damasco e o suicida-bomba, sexta-feira passada, em Aleppo.

Quem imaginaria que o que a Casa de Saud deseja ver na Síria – um regime islâmico – é exatamente o que a al-Qaeda também deseja para a Síria?

Ayman "O Cirurgião" al-Zawahiri, número 1 da al-Qaeda, em vídeo de oito minutos, intitulado "Avante, Leões da Síria", acaba de convocar à luta os muçulmanos no Iraque, Jordânia, Líbano e Turquia, para derrubar o "regime pernicioso, canceroso", de Bashar al-Assad. De fato, já estavam alistados, em geral, mesmo antes de O Cirurgião entrar em cena. E não só eles, mas principalmente os "combatentes da liberdade" líbios transplantados, conhecidos antigamente como "os rebeldes".

Quem imaginaria que o que o CCG-Otan (Conselho de Cooperação do Golfo+Organização do Tratado do Atlântico Norte) deseja ver na Síria é exatamente o que a al-Qaeda também deseja para a Síria?

Portanto, quando, apesar de todos os horríveis ataques militares que matam sobretudo os civis apanhados no fogo cruzado, o governo de Assad diz que está combatendo "terroristas", ele, em termos precisos, não está mentindo. Até aquela entidade onipresente, proverbial, "funcionário do governo dos EUA que não quis identificar-se" já culpa a al-Qaeda na Terra dos Dois Rios, AQI, pelas recentes explosões. E, além desses, também o vice-ministro do Interior do Iraque Adnan al-Assadi: "Temos informações de inteligência de que vários jihadists iraquianos partiram para a Síria."

Assim sendo, se não deu para fazer da Síria a nova Líbia, no sentido de uma resolução da ONU autorizar o bombardeamento humanitário – vetada por dois BRICs, Rússia e China –, a Síria pelo menos já é uma nova Líbia, no sentido dos escandalosos laços entre "os rebeldes" e os jihadis salafistas linha-dura.

E dado que o ocidente absolutamente adora situações de ganha-ganha, mesmo que pré-fabricadas, é perfeitamente possível que aí esteja, prontinho, o casus belli que o Pentágono esperava – libertar a Síria de uma "al-Qaeda" que, antes, não estava lá. Não esqueçam que – apesar de todo o alarde sobre a "deriva" do governo Obama/Pentágono, afastando-se do Médio Oriente e voltando-se para o Leste da Ásia, toda a "guerra global ao terror" (global war on terror, GWOT), que Obama rebatizou de "operações contingenciais além-mar" ("overseas contingency operations", OCO), continua bem viva, vivíssima.

Libertem-me, para eu matar à vontade

No ano passado, o Asia Times Online advertiu inúmeras vezes que a Líbia "libertada" – e "libertada" pelos chamados "rebeldes da OTAN" – rapidamente se transformaria em inferno povoado de milícias armadas. Exatamente o que lá se vê hoje: há pelo menos 250 milícias diferentes, só em Misurata, segundo o Human Rights Watch; as milícias são polícia, juízes e carrascos-executores, tudo ao mesmo tempo. Por falar nisso, não há Ministério da Justiça na Líbia "libertada". Se você for preso e chegar à cela, ali mesmo será executado; e se for africano subsaariano, ainda ganha, de brinde, longo período de tortura, num campo libertado de prisioneiros, antes de ser executado.

Como se viu acontecer na Líbia – porque é questão estratégica para o eixo Casa de Saud/sunitas do Qatar –, já não há qualquer possibilidade de autêntico diálogo entre a insurreição (armada) e o regime de Assad. Afinal, o objetivo chave é derrubar o regime de Assad. Então, a propaganda reina absoluta, nos media árabes controlados quase todos ou pelos sauditas ou pelos qataris.

Por exemplo: o muito louvado Observatório Sírio de Direitos Humanos, com sede em Londres, e que vive de vomitar estatísticas sem qualquer comprovação, números e mais números, sem fim, dos "massacres" cometidos pelo governo sírio – falaram até em "genocídio" –, é mantido com dinheiro de uma entidade sediada em Dubai e financiada por obscuros doadores ocidentais e do Conselho de Cooperação do Golfo.

Para completar, os 'especialistas' mediáticos da "oposição" orientam com precisão de mira a laser toda a cobertura da imprensa-empresa ocidental. A rede CNN atribuiu as bombas de Aleppo, na 6ª-feira, a "terroristas" – assim, entre aspas. Imaginem a histeria total, se fosse a Zona Verde dos EUA, no Iraque, atacada à bomba pela resistência sunita, em meados da década dos 2000. A BBC acreditou realmente na versão de propaganda que a Fraternidade Muçulmana Síria distribuiu, segundo a qual o governo sírio se autobombardeara: tão verossímil como a 'notícia' de que o Pentágono se autobombardeava na Zona Verde. Quanto aos media árabes – em grande parte controlada por sauditas e qataris –, ignorou completa e absolutamente a conexão al-Qaeda.

A Liga do Conselho de Cooperação do Golfo – antiga Liga Árabe –, depois de bombardear o próprio relatório da própria comissão sobre a Síria, porque não reproduzia a narrativa pré-fabricada sobre um governo "do mal" que bombardeava unilateralmente o próprio povo, anda agora propagandeando um supostamente humanitário Plano B: uma missão de paz árabes/ONU, para "supervisionar a execução do cessar-fogo". Mas que ninguém se deixe enganar: a agenda ainda é a mudança de regime, como antes.

O príncipe Saud al-Faisal, ministro de Relações Exteriores da Arábia Saudita, já começou a fazer os ruídos certos, descartando qualquer intervenção humanitária. Simultaneamente, é muito edificante ouvir a Casa ("oh, como somos progressistas") de Saud a lamentar a "falta de comprometimento do governo sírio" e a pontificar que "a Síria passa hoje, não por uma guerra de guerrilha, nem racista nem sectária, mas por matança em massa, sem qualquer consideração humanitária".

Imaginem o quanto seriam "humanitárias" as "considerações" da Casa de Saud, no caso de emergir um movimento pró-democracia entre a maioria xiita que habita a província Leste (já aconteceu; o movimento emergiu e foi reprimido com violência extrema). Melhor ainda: lembrem como os sauditas tinham ar "humanitário", quando invadiram o Bahrain.

A agenda do CCG-OTAN permanece inalterada: mudança de regime, por não importa qual meio. Até o Guerreiro-em-Chefe e presidente dos EUA Barack Obama já disse isso, ele mesmo, em pessoa. Os fantoches do CCG obedecerão servis e felizes. Portanto, só resta esperar uma inflação de Kalashnikovs através da fronteira, mais carros-bomba, mais suicidas-bomba, mais civis mortos no fogo cruzado e a lenta, imensamente trágica, fragmentação da Síria.


*Pepe Escobar é jornalista do Asia Times Online

Fonte: Resistir.info

Tradução: Vila Vudu

Imagem: rededemocratica.org

Um comentário:

P. P. P. disse...

DOMINGO, 19 DE FEVEREIRO DE 2012

Paul Crair Roberts: Tirania nos EUA já foi institucionalizada!
Paul Craig Roberts: Previsão para o novo ano - do Vermelho
QUANDO EM MARÇO DE 2010 DEIXEI A MINHA COLUNA NO CREATORS SYNDICATE E PUS A CANETA DE LADO, RECEBI TANTOS PROTESTOS DOS LEITORES QUE DOIS MESES MAIS TARDE COMECEI DE NOVO A ESCREVER. ESTA RENOVADA ATIVIDADE RESULTOU NESTE NOVO ANO NUM SÍTIO DE REDE PESSOAL (VER AQUI).


As minhas colunas vão aparecer primeiro no meu sítio. Os sítios onde os meus leitores estão habituados a encontrá-las podem continuar a publicá-las desde que ligadas ao meu sítio e indicando os direitos de autor. O sítio mantém-se se o apoio dos leitores o justificar. De outro modo, concluirei que o custo do sítio excede o valor daquilo que tenho para dizer.

Este passado ano não foi bom para os 99% e o novo ano parece vir a ser ainda pior. Esta crônica trata das perspectivas sobre a liberdade. A próxima será sobre as perspectivas econômicas.

As perspectivas para a liberdade são tristes. Os escritores críticos das guerras ilegais de Washington e da subversão da Constituição dos EUA podem ver-se em prisão indefinida, porque as críticas às políticas de Washington podem ser consideradas ajudas aos inimigos de Washington, podendo incluir organizações de caridade que forneçam ajuda às crianças palestinas bombardeadas e frotas que tentem fornecer ajuda humanitária a Gaza .

Os regimes de Bush/Obama estabeleceram as bases para a detenção de críticos do governo sem o devido processo legal. A Primeira Emenda tem sido restringida a todos, menos aos americanos snobs que cantam USA! USA! USA! Washington estabeleceu-se a si própria como procurador mundial, condenando outros países por violações dos direitos humanos, ao mesmo tempo que pelo seu lado bombardeia meia dúzia de países atrasados e ameaça vários outros com o mesmo tratamento, violando de caminho a lei fundamental dos EUA e as convenções de Genebra sobre a tortura a detidos.

CNTINUA EM....

http://guerrilheirodoentardecer.blogspot.com/2012/02/paul-crair-roberts-tirania-nos-eua-ja.html

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