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terça-feira, 23 de outubro de 2012

Paraguaios se manifestam contra multinacional do Canadá



Paraguaios rechaçam instalação multinacional canadense no país

O Paraguai continua enfrentando as consequências do Golpe de Estado que tirou derrubou o presidente eleito, Fernando Lugo. Sem resposta do então governo golpista de Federico Franco, a população mais uma vez se manifesta. 


Dessa vez o motivo é a instalação da multinacional canadense Río Tinto Alcán que, segundo os movimentos organizados, pretende pagar um preço bem inferior ao que está estabelecido no mercado internacional pela energia produzida pelas usinas Itaipu e Yacyretá.


Há alguns meses, se lançou uma campanha para coletar 1.000 assinaturas contra a instalação da Rio Tinto Alcán. Em comunicado, se denunciava que as negociações e a intenção de abrir as portas para uma transnacional sem a devida consulta do povo feria a soberania do país, uma vez que se trata de recursos naturais, como a água e a energia elétrica.

"Desde o início da campanha ‘Não ao Golpe de Río Tinto Alcán’, denuncia a mencionada multinacional ligada à máfia local e ao narcotráfico com representação parlamentar, repudiando igualmente a quebra do processo democrático do país, sofrida no mês de junho”, afirmava o comunicado.


O trecho faz menção ao fato de o Canadá ter sido o terceiro país – depois do Vaticano e Alemanha – a reconhecer o governo ilegítimo, resultado do Golpe de Estado ocorrido em junho deste ano no país. Os movimentos apontam que a instalação da empresa hidrelétrica já seria de interesse do governo canadense.

De acordo com a Campanha, a Rio Tinto Alcán pretende pagar 38 dólares por megawatts da energia paraguaia, quando o custo real seria de 60 megawatts. A construção de duas turbinas – uma e Itaipú e outra em Yaciretá ficariam livres de impostos, os quais seriam pagos pelos cidadãos e cidadãs paraguaios.


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Relembrando 


Por Silvio Núñez 

Parece ter passado despercebido na imprensa internacional que um dos primeiros países, depois do Vaticano e da Alemanha, que reconheceu o novo governo instalado no Paraguai mediante um golpe parlamentar, foi o Canadá. O governo do Canadá, através de sua embaixada de Buenos Aires, vem realizando desde 2009 um intenso lobby a favor da indústria extrativa Río Tinto Alcán que quer se instalar nesse país sul-americano.



Mas, o quê representa a Río Tinto Alcán ?


A Río Tinto Alcán (RTA) é a segunda maior produtora de alumínio no mundo, se dedica também a extração de diversos minerais e tem presença nos cinco continentes.

As denúncias contra a RTA incluem acusações de genocídio e crimes de lesa humanidade.

Em Papua Nova Guiné, ilha de Bougainville, a empresa é acusada de ter instigado, em 1980, um levante armado que provocou o uso de forças militares e milhares de mortos. A seguir, depois que os trabalhadores começaram a sabotar a mina, em 1988, a Rio Tinto foi acusada de conspirar para impor um bloqueio que resultou na morte de cerca de 10 mil civis até 1997. O caso se encontra atualmente na Corte dos EUA, no caso "Sarei et al v. Rio Tinto Plc et al", 9ª Corte de Apelações, N° 02-56256.


O jornalista paraguaio Guido Rodríguez Alcalá faz uma breve mas contundente história da RTA no mundo: apoio ao regime racista da África do Sul; o governo da Noruega pôs a RTA na lista negra por atentar contra o meio ambiente e os direitos humanos; por razões similares, o movimento “Fora do Pódio” deseja eliminar a RTA como patrocinadora dos Jogos Olímpicos... E a lista continua.


O investimento no Paraguai: um enorme consumo de energia


Francisco Rivas
É importante esclarecer que o Paraguai é produtor de energia hidroelétrica, compartilhando centrais binacionais com seus vizinhos, Argentina e Brasil. Entretanto, 4/5 desta energia é exportada e só 1/5 utilizada no país. A RTA deseja consumir, a baixos preços, uma quantidade equivalente (1/5). O investimento da RTA dividia o governo paraguaio. Embora o Presidente da República houvesse se manifestado contrário a um subsidio ao preço da energia, o ministro de Indústria e Comércio, Francisco Rivas - confirmado como ministro pelo novo presidente Federico Franco - e o então vice-presidente Federico Franco haviam se manifestado favoráveis a cumprir as condições da RTA para sua vinda ao Paraguai. O vice-ministério de Energia havia afirmado, entretanto, que os subsídios à energia para a RTA equivalia a US$200 milhões/ano, crescentes. Igual opinião compartilhavam outros ministros não liberais.


Posição complacente e crítica do Governo

Depois de duas audiências públicas realizadas pelo mesmo governo, a batalha na opinião pública parecia dividida. Por ser um assunto sumamente popular e com um apoio majoritário, o investimento da Río Tinto Alcán começou a gerar opiniões críticas dos mais diversos setores.
As opiniões mostram sua máxima polarização quando o então vice-presidente critica publicamente a vice-ministra de Minas e Energia, segundo publicação do jornal Ultima Hora, de 30 de maio passado: “Então, eu disse ao presidente da República (Lugo): para que me enviou ao Canadá e nos pôs a estudar isto, se no final uma vice-ministra (Mercedes Canese) vai se opor. Eu tenho o direito de pensar que o que se pretende é continuar favorecendo a economia brasileira, porque não cabe na minha cabeça que, podendo vender energia muito mais cara que a que cedemos ao Brasil, gerando emprego, impostos e divisas, tenha gente que se oponha a este projeto”. Similares publicações podem ser vistas em outros meios.
A afirmação de Franco é um falso dilema, pois a venda de energia do Paraguai de Itaipú ao Brasil gera divisas para o desenvolvimento e o investimento e, além disso, o que a RTA se propõe é pagar preços inferiores - inicialmente 32 US$/Mwh e atualmente 42 US$/Mwh - aos que o Brasil paga e que, embora ao preço atual de 52,2 US$/Mwh, somente produzem um pequeno beneficio (8,4US$/Mwh) e cobrem ao mesmo tempo os custos de produção (43,8US$/Mwh).


A RTA pressiona o governo para iniciar negociações

Depois das declarações de Federico Franco, a empresa manifestou seu interesse em iniciar as negociações com o governo, pressionando sobre o cronograma de instalação da planta. Assim, no dia 13 de junho foi publicada nos meios de comunicação a visita dos representantes da RTA ao Chefe de Gabinete da Presidência da República. Na oportunidade, seu representante, o hispano-brasileiro Juan Pazos, afirmou: “Consideramos, depois de três anos e meio que estamos no Paraguai, que o governo já tem todas as informações que necessita”. "Evidentemente, um tema central é o preço da energia. Não se pode discutir o preço da energia, sem discutir o resto. Formam parte de um pacote”. A multinacional não informou o valor que considera "ideal" pela energia paraguaia.


O golpe em gestação


Dois dias depois, em 15 de junho, aconteceu a tragédia de Curuguaty. Uma juíza determinou uma ordem de busca e apreensão a pedido do empresário colorado Blas M. Riquelme, para resguardar sua suposta propriedade privada. A ação é coordenada pela promotoria e termina com a morte de 18 campesinos e policiais. No lugar, que depois a própria imprensa indicaria que eram terras públicas usurpadas por Blas M. Riquelme, havia menos de 50 pessoas no momento do massacre.
O resto é história. Nesse mesmo dia, Fernando Lugo substituiu Carlos Filizzola (da Frente Guasú) no Ministério do Interior pelo colorado, ex- Procurador Geral do Estado, Rubén Candia Amarilla, responsável por mais de 1000 denúncias de movimentos sociais e vinculado a Camilo Soares, ex- Secretário de Emergência Nacional, acusado por malversação e membro do primeiro círculo de Fernando Lugo. Na segunda-feira, 18 de junho, a Frente Guasú expressou seu desacordo com dita designação, junto com o Partido Liberal Radical Autêntico (partido de Federico Franco e Francisco Rivas) e, para mais desconcerto, a própria Associação Nacional Republicana, Partido Colorado, criticou sua nomeação.
Na quinta-feira, 21 de junho, a Câmara de Deputados aprovou a abertura de um processo político contra Fernando Lugo. No dia seguinte, 22 de junho, o Senado aprovou em tempo recorde o afastamento do presidente.


Golpe parlamentar

A notícia do jornal La Tercera, do Chile, reproduz a declaração do Secretário geral da OEA, José Miguel Insulza “...que, reconhecendo que o artigo 225 da Constituição do Paraguai confere faculdades à Câmara de Deputados para iniciar um juízo político e ao Senado para atuar como tribunal, "a comunidade internacional formulou dúvidas fundadas sobre o cumprimento das normas contidas nos artigos 17 e 18 da Constituição do Paraguai e nos tratados internacionais subscritos por esse país, que consagram os princípios universais do devido processo e do legítimo direito de todo processado de defender-se, usando todos os recursos processuais, contando para isso com prazos suficientes entre o inicio do juízo e sua conclusão"...”.
O presidente do Paraguai teve menos de 24 horas para preparar sua defesa e não foram apresentadas provas - exceto fotocópias e publicações da imprensa - para formalizar as acusações.


Transnacionais, entre elas a RTA, as primeiras beneficiadas com o golpe


Corretamente, analistas políticos atribuíram aos grandes oligopólios da produção de grãos como os principais beneficiados do golpe de Estado contra Fernando Lugo. Lugo foi submetido a um sumaríssimo juízo político pela matança de Curuguaty, que desnuda uma realidade que não pode ser ignorada: oito milhões de terras mal havidas que não foram recuperadas pela Justiça, e o Paraguai com a pior distribuição da terra na região. Apesar de a ordem de despejo ter sido ditada por uma juíza e o operativo policial dirigido por uma fiscal, o julgado foi Fernando Lugo.
Entretanto, se esqueceram de um ator chave: a RTA.
Em seu discurso de posse, Federico Franco se referiu longamente ao tema energético, “Também impulsionará o setor energético para utilizar a energia gerada nas hidroelétricas de Itaipú e Yacyretá e "que ninguém tenha que ir ao exterior procurar trabalho".”
O Canadá reconheceu imediatamente. Logo em seguida, o nome de Francisco Rivas foi confirmado como Ministro de Indústria e Comércio e lobista da RTA. Evidentemente, as razões são milhões.






Fonte: Carta Maior, Vermelho
Imagem: Google

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